Toda emoção, em certa medida, pode ser ruim ou boa, dependendo da relação com o contexto, frequência e intensidade
A ansiedade é uma emoção que faz parte da experiência de todas as pessoas, inclusive das crianças. Entre os principais problemas ligados à ansiedade encontram-se as demonstrações de dependência, diferentes tipos de medo, nervosismo, preocupações e insegurança. Como é frequente e comum que se experimente em algum momento da infância diferentes tipos de medos e preocupações, como por exemplo, de escuro, de animais específicos, de barulhos, de situações novas e estranhas e de mudanças súbitas, ainda existe uma dificuldade na diferenciação de ansiedades típicas e transitórias da ansiedade em nível de prejuízo para saúde mental.
Em termos gerais, o que define a ansiedade enquanto problema na infância é o grau de prejuízo, estresse, falta de controle, caráter invasivo e persistência dos sintomas. “Avalia-se que a ansiedade nas crianças passa a ser um problema ao seu desenvolvimento na medida em que ela ocorre com frequência ou intensidade que atrapalha a rotina social ou escolar, dificultando o uso das habilidades que ela adquiriu anteriormente no contexto atual ou dificultando a aprendizagem de novas habilidades importantes para o seu desenvolvimento”, explica a psicóloga clínica do Instituto de Análise do Comportamento de Bauru (IACB), Natália Pinheiro Orti.
Os principais transtornos de ansiedade na infância e adolescência são as fobias específicas, a fobia social, a ansiedade de separação, padrões obsessivo-compulsivos, ataques de pânico e ansiedade generalizada.
“Há características de temperamento que predispõem uma maior probabilidade de experimentar a ansiedade na relação com o ambiente: reativiade emocional, retraimento social e a inibição. De modo geral, são crianças que se apresentam mais reservadas, tímidas ou que apresentam maior sensibilidade, reatividade e intensidade das emoções”, detalha Natália.
Tais características não são necessariamente inferiores ou ruins, uma vez que podem facilitar a aprendizagem de alguns repertórios e dificultar outros, dependendo do contexto. “Os fatores do temperamento interagem com fatores do ambiente ao longo do desenvolvimento dos ser humano, por isso não se deve ter uma perspectiva determinista dessas características. Além de considerar as vantagens e prejuízos da ansiedade para o desenvolvimento das crianças na perspectiva dos adultos, é importante compreender o significado de tais características para a própria criança e o quanto elas têm valor adaptativo para ela. Entretanto, quando a criança apresentar muitas dificuldades para interagir socialmente com outras crianças ou adultos, ou demonstrar sofrimento significativo ou inibição prolongada em situações de exposição, pode ser importante recorrer a uma avaliação profissional”, acrescenta a psicóloga.
Para Roberta Miguel Green, psicóloga clínica que também atua no IACB, algumas práticas dos pais e cuidadores, mesmo sem querer, podem estimular ou valorizar a experiência de ansiedade dos filhos. “As principais práticas parentais correlacionadas com problemas de ansiedade dos filhos são problemas na comunicação, excesso de conflitos no ambiente familiar, pouca aceitação e apoio, baixa expressão de responsividade e afeto, negligência, rejeição, superproteção, excesso de controle, excesso de críticas e exigências, falhas no ensino de autonomia e estabelecimento de vínculos inseguros”, discorre.
Apoio e validação social são fundamentais para mediar a experiência da criança diante dos muitos desafios e mudanças em seu desenvolvimento, com a importante presença de adultos que sejam acolhedores e compreensivos com as dificuldades vivenciadas pelas crianças e jovens. “É importante que os pais que aceitem e respeitem características da individualidade dos filhos, mesmo àquelas que não correspondem às expectativas dos próprios pais e da comunidade escolar, como por exemplo, alunos que não tiram somente notas altas, alunos que não são os mais populares da escola, alunos que não se destacam nos esportes ou nas atividades acadêmicas. Pais que expressam afeto e estabelecem uma comunicação próxima, eficiente e segura contribuem para que os filhos se expressem e se exponham e se desenvolvam de modo mais confiante e livre de comparações”, diz Roberta.
Existem muitas variáveis que explicam a diversidade de características e limitações das crianças e dos seres humanos de forma geral. “Compreender e aceitar imperfeições e variabilidades é um valioso recurso de apoio, a partir do qual se pode refletir em conjunto com os filhos o que são características pouco saudáveis ou nocivas ao desenvolvimento ou, se são apenas variações comportamentais”, completa a terapeuta Roberta Green.